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quarta-feira, 15 de julho de 2009

Amigos Eternos e Efémeros


Hoje estive na festa de aniversário de um amigo recente onde me encontrei com alguns outros que conheci na mesma data e outras tantas pessoas que não conhecia.

Às tantas, dei comigo a conversar com uma desconhecida que era amiga do anfitrião à quase cinquenta anos. Apontou algumas outras pessoas presentes que estavam na mesma situação dela. Meio século! É uma vida. Lembrei-me dos meus amigos de infância e dos poucos que ainda mantenho. Lembrei-me também dos recentes e de todos aqueles que encontrei ao longo da vida e com os quais já não mantenho contacto. Fez-me pensar no que é que nos leva a manter alguns amigos durante toda a vida, enquanto nos afastamos de outros ou eles de nós.

Não é a distância geográfica, o nível de formação, a profissão que se exerce ou a situação familiar de cada um que define se uma relação de amizade se vai ou não prolongar. Existem amizades duradouras entre pessoas tão diferentes ou mesmo que moram em países distantes enquanto pessoas que vivem quase juntas e têm uma situação de vida muito semelhante não conseguem ser amigas durante muito tempo. Existem até pessoas que quando se conhecem parecem ter tanto em comum, que quase juram que a sua amizade será eterna e no entanto passados poucos anos deixam de se contactar. Não existe nenhum padrão, nenhuma referência que nos ajude a determinar a durabilidade das relações de amizade. O facto é que, a menos que vivamos sempre no mesmo lugar e estejamos em contacto apenas com o mesmo grupo de pessoas, todos nós passamos a vida a fazer amigos, dos quais apenas alguns mantemos.

A definição de amigo varia consoante a personalidade, a cultura, a maturidade e a experiência de cada um. Algumas pessoas vêm um amigo como um prolongamento de si próprio, enquanto outros como um apêndice, outros ainda como um complemento; talvez o que faça falhar algumas relações será a não aceitação pelo outro do papel que descobriu que desempenha perante o amigo. Uma relação para durar, qualquer que ela seja, exige a aceitação da mesma condição pelo outro, é claro que isto também se aplica à amizade. Não é provável que eu seja amigo de alguém que me vê como um prolongamento de si próprio, quando eu apenas o vejo como um apêndice ou complemento. A diferença de visões ou conceitos da amizade pode estar na origem do afastamento das pessoas.

A imaturidade pode também determinar a falência das relações: ser amigo é aceitar as diferenças, saber ouvir, perdoar, estar presente, dar liberdade, ensinar, partilhar. Não podemos pretender que o nosso amigo seja igual a nós, pense como nós ou tenha a mesma opinião. Ele tem o direito de ser diferente, tal como nós. O importante é que apesar disso esteja do nosso lado para nos apoiar, mesmo que pense de forma contrária à nossa, nos ajude a levantar quando, persistindo nos nossos erros, caímos. Temos que ter capacidade de perdoar pois todos nós erramos e temos o direito a uma segunda oportunidade. É importante também que ninguém se sinta aprisionado. Quando sentimos que alguém nos está a prender o nosso instinto é o de procurar liberdade. Por outro lado, transmitir os nossos conhecimentos e partilhar os nossos recursos de forma a ajudar o outro a ultrapassar os seus próprios obstáculos contribui para o seu crescimento e como tal intensifica a amizade. Tudo isto tem a ver com a maturidade do próprio indivíduo, que quanto maior é, mais salutares são as relações que estabelece. A relação pode não durar se um dos intervenientes trair os pressupostos que enunciei no início deste parágrafo.

Aquela máxima de "A friend in need is a friend indeed (um amigo necessitado é um amigo de verdade)" parece apenas referir-se a amigos por interesse. Um amigo de verdade é aquele que o é mesmo que o não possamos ajudar em nada, que o continuará a ser quando já não precise. Porém assiste-se muito a "amigos de ocasião", ou seja, determinadas pessoas que apenas são amigas enquanto se mantém determinada circunstância. Será que podemos chamar a essas pessoas amigas? Será que os amigos que o deixam de ser um dias são todos "amigos de ocasião"? Nem sempre. Muitas vezes a vida torna-nos tão diferentes que os nossos universos se tornam impossíveis de cruzar. O importante é que enquanto são amigos aproveitem ao máximo esse previlégio. Porque a amizade é uma das coisas mais importantes de que algum dia podemos usufruir. Se não se prolongar por algum motivo, que se prolongue ao menos na nossa memória. E vivam as amizades eternas, porque ambos os amigos descobriram o verdadeiro sentido da palavra "amizade".

sábado, 11 de julho de 2009

O "KISS"


Não, não é um beijo. KISS é o acrónimo de "Keep It Simple, Stupid" e "é um princípio geral que valoriza a simplicidade de projecto e defende que toda a complexidade desnecessária seja evitada. Serve como fórmula útil em diversas áreas como o desenvolvimento de software, a animação, a engenharia no geral e no planejamento estratégico e táctico. Também é aplicado na Literatura, na Música e nas Artes em geral. Este princípio teve a sua inspiração diretamente do princípio da Navalha de Occam e das máximas de Albert Einstein ("tudo deve ser feito da forma mais simples possível, mas não mais simples que isso") e de Antoine de Saint-Exupéry ("A perfeição é alcançada não quando não há mais nada para adicionar, mas quando não há mais nada que se possa retirar") (Wikipédia).

Simplificar pode ser a solução para muitos dos nossos problemas. Quantos de nós nos fartamos de queixar pela falta de tempo, pelo cansaço, pela falta de dinheiro, pela falta de amigos...?! E quantas vezes já olhamos bem a fundo para a nossa vida, analisando imparcialmente onde estamos a errar? Se calhar nunca, ou então sempre que o fazemos chegamos à conclusão de que não poderíamos ter feito melhor.

Vivemos na era do consumismo, do comodismo, do egoísmo; vivemos em função da maximização da qualidade de vida sem entendermos muito bem o que isso significa; não entendemos que muitas das coisas que temos são supérfluas, aprisionam-nos e exigem de nós muito mais do que o prazer ou benefício que nos dão em contrapartida.

Vou analisar aqui uma situção concreta: Paula e Mário, ambos advogados, pais de um filho adolescente, viviam numa casa de cinco assoalhadas, ar condicionado e música ambiente, uma televisão em cada assoalhada, com mais de cem canais, três casas de banho, janelas automáticas entre outras comodidades. Tinham a casa dos seus sonhos, num condomínio fechado, com piscina, três elevadores. Para pagar o empréstimo do banco e para manter a casa necessitavam de uma avultada quantia de dinheiro todos os meses. Para o efeito, começaram ambos a aceitar mais casos. O tempo era pouco e como tal tiveram que contratar uma empregada. Contudo isso ainda acresceu mais as despesas e tiveram que trabalhar durante o Sábado. Como prometeram ao filho umas férias em Bora Bora, começaram a trabalhar também ao Domingo.

Não passavam tempo quase nenhum em casa; estavam constantemente cansados e Mário começou a sofrer de hipertensão; o filho passava o dia ao computador e não estudava, estando em vias de reprovar nos exames. Paula tinha tudo o que sempre ambicionou, no entanto não se sentia feliz.

Certo dia chegou a casa, sentou-se no sofá, pegou no comando, ligou a televisão da sala e pela primeira vez num mês preparou-se para assistir a um filme. Apercebeu-se de que tinha tantas televisões, tantos canais, mas não tinha tempo de ver nenhum deles, o mesmo acontecendo com o marido e o filho, que preferia a internet. Levantou-se e deu um passeio pela casa. Há meses que não entrava ninguém no quarto de hóspedes, não tinham tempo para receber ninguém em casa. Olhou pela janela e viu a piscina onde já não punha os pés há meses. Havia sempre tantas contas a pagar, tanto trabalho a fazer... Uma casa assim dá muitas despesas. Então Paula deu-se conta de que estava a trabalhar para o boneco. Estava a trabalhar para financiar algo de que não podia usufruir; deu-se conta de que apesar de ter tudo o que sempre quis ter, não tinha o que verdadeiramente lhe interessava: passar tempo em família, estar com os amigos, divertir-se.

Foi então que, em conjunto com o marido e o filho tomaram uma decisão: mudar para uma casa mais pequena, na periferia. Não tinha nem metade das comodidades que aquela tinha, mas de que interessava tê-las se não podiam gozar delas? Dispensaram a empregada e Paula passou a assumir as tarefas da casa. Três assoalhadas mais pequenas eram suficientes para todos. Uma televisão na sala com um pacote mínimo e um sofá-cama que servia perfeitamente para transformar a sala em quarto de hóspedes caso houvesse algum. Não tinham música ambiente nem janelas automáticas, nem piscina, mas no final todos sentiram que valeu a pena a mudança.

A renda diminuiu, bem como os custos de electricidade, condomínio, entre outros. Isto fez com que tivessem que trabalhar muito menos e poder assim passar mais tempo uns com os outros; apenas uma televisão na sala contribuiu para aproximar a família; começou a haver tempo para conviver com os amigos, o que os alegrou imenso; no final ainda sobrou dinheiro para fazerem aquela viagem a Bora Bora que andavam à tempo a prometer ao filho.

Simplificar mudou a vida desta família. A adaptação foi difícil, ao princípio acharam que apenas iam ganhar desconforto, mas a verdade é que o nível de felicidade aumentou.

Complexidade gera complexidade e às tantas esta complexidade atrofia, aprisiona. Esquematizar a vida de forma simples torna os objectivos mais possíveis. Estabelecer como prioridade objectivos imateriais em vez dos materiais faz com que seja necessário muito menos esforço, faz com que os últimos percam importância face aos primeiros, o que contribui para o reforço de valores como a amizade, a família, o altruísmo, pois procurar a felicidade nas coisas simples é muito mais satisfatório e fácil de atingir do que nas mais complexas; ter muito é apenas satisfazer caprichos, quando nos basta tão pouco para termos o que realmente importa. Por isso, aproveite e KISS....

quarta-feira, 1 de julho de 2009

Identidades Falsas

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A maioria de nós nasce e morre transitando por esta vida como se de um palco se tratasse. Porque somos todos actores, não só porque representamos papéis, mas porque usamos máscaras que nos transformam naquilo que queremos ou aprendemos a ser.
Desde o momento em que nascemos que estamos sujeitos ao processo de socialização, que muitas vezes se inicia no acto de cortar o cordão umbilical. A partir daí são-nos ensinados valores, códigos de conduta e aplicados castigos a comportamentos considerados desviantes pela sociedade. Quando nascemos, a nossa mente está vazia. Começamos a enchê-la com o que temos ao nosso redor, aprendemos e apreendemos aquilo que nos facultam, que será o que vigora na sociedade e na época em que vivemos. Mais tarde, quando começamos a ter capacidades para agir por conta própria, fazêmo-lo nos limites daquilo que nos é permitido, que aprendemos como sendo certo ou errado e enraizamos fortemente na nossa consciência.
Aquilo que somos hoje, não é mais que massa moldada na mesma forma onde o foram todos os membros da sociedade em que vivemos: a língua que falamos, o vestuário que vestimos, as leis a que obedecemos, etc.. Consoante o lugar e o tempo assim esta moldagem é mais ou menos rígida, mas o facto é que nos tormamos não naquilo que verdadeiramente somos, mas naquilo que a sociedade espera que sejamos, sob pena de sermos considerados marginais e de nos serem aplicadas medidas de coacção que variam desde a simples reprovação a penas de prisão.
Representamos diariamente papéis: somos pais, filhos, professores, alunos, jardineiros, economistas, compradores, vendedores, velhos, jovens... Todos estes papéis têm características comuns e únicas que os tornam perfeitamente definidos: todos os pais se comportam de determinada forma que não se coaduna com o comportamento dos seus filhos, ou mesmo deles próprios enquanto filhos, o mesmo acontecendo com os alunos e professores, com os velhos e com os jovens. É esperado que se actue de acordo com o papel que se detem e normalmente sabemo-lo de cor, pois levamos a vida a aprender como o representar. Mas mais do que aprender comportamentos, aprendemos o conceito do certo e do errado, do bonito e do feio, do bom e do mau, do rude e do elegante, etc.. Moldamos a nossa consciência de forma a tornar-se parte de uma muito maior, a da sociedade como um todo. Deixamos de poder ser apenas um indivíduo para passar a ser uma célula de um corpo único, do qual fazem parte outros seres humanos. O que seríamos se fossemos nós próprios? Ou melhor, o que é ser nós próprios? Será que em alguma circunstância estivemos livres da influência do que aprendemos?
Porém, todo o ser humano existe individualmente. Existe algo que ainda se mantém intacto dentro dele: a sua identidade. O que acontece é que na maioria das vezes está adormecida, foi chutada para o fundo do nosso ser e é tão constantemente empurrada para dentro pelo nosso consciente que nos esquecemos de qual ela é. Pensamos até que somos aquilo que aparentamos ser, enganamo-nos a nós mesmos. Muitas vezes a nossa verdadeira identidade é tão diferente daquela que ostentamos que se gera um conflito com consequências nefastas como depressões, doenças somáticas, desiquilíbrios emocionais e comportamentos considerados desadequados pelas normas sociais em vigor. É que geralmente o inconsciente tem mais força que o consciente e aquilo que empurramos para o dentro é repelido para fora com maior intensidade. Mas na medida em que não aprendemos a lidar com isso, nem sequer sabemos interpretar o que nos está a acontecer. Então recorremos a terapêutas, tomamos medicamentos, procuramos conselhos de amigos, etc, sempre na tentativa de repôr a normalidade, quando por vezes a normalidade que ambicionamos é construída com base numa identidade falsa. Recusamo-nos a deixar a máscara que vestimos, pois não sabemos viver sem ela. Por isso somos toda a vida actores, mesmo sem termos consciência disso. E dizem algumas pessoas que não têm veia artística!!

quarta-feira, 24 de junho de 2009

Agir faz acontecer

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    Sempre que existe uma acção, existe movimento. Agir significa fazer alguma coisa. Sempre que damos um passo, tomamos uma decisão, apagamos um número de telefone ou simplesmente aceitamos interiormente determinado facto, estamos a empreender uma acção. Não temos obrigatoriamente que fazer grandes coisas, por vezes as mais pequenas têm a mesma ou maior importância. A verdade é que sempre que passamos da inércia à acção fazemos algo acontecer, quer directa quer indirectamente.

 
    Quantas vezes não nos aconteceu passarmos a tarde inteira à espera de um telefonema e justamente quando decidimos não esperar mais, eis que o telefone toca? Ou então quando finalmente decidimos entregar aquele currículo para o emprego que tanto ambicionamos, nos liga um amigo que não víamos à muito tempo, simplesmente porque se lembrou de nós? Estas coisas não acontecem por acaso nem há magia ou qualquer força oculta por detrás. Somos nós mesmos que fazemos as coisas acontecerem, ainda que o nosso acto em nada tenha a ver com o que acontece de seguida. Enquanto estamos indecisos, parados, é como se estivessemos a bloquear a energia positiva que acciona os mecanismos do universo que favorecem o desencadear dos bons acontecimentos. Isto não tem nada de esotérico, é uma constatação. A energia de que falo não é mais do que aquela que existe dentro de cada um de nós e que influencia tudo à nossa volta. Criamos coincidências, pode-se dizer, ainda que as atribúamos a causas externas. A nossa interacção com tudo o que nos rodeia permite influenciar positiva ou negativamente os acontecimentos, bem como o momento em que eles ocorrem. Porque fazemos parte de um todo, de uma rede global, não somos ilhas.
Tal como o bater das asas de uma borboleta na Europa pode causar um tornado na América, também tudo o que fazemos e pensamos por mais insignificante que seja tem consequências. Se até o simples facto de existirmos altera o universo, quanto mais não seja estatísticamente, porque não hão-se as nossas acções provocar outras acções?

    A inércia não faz bem a ninguém e em determinados momentos da nossa vida ela é simplesmente tóxica. Por exemplo, quando estamos deprimidos, combatê-la pode significar desencadear processos que nos levem a sair dessa fase. Se eu pintar os olhos antes de sair para o trabalho hoje, posso pensar que não estou a fazer nada de especial. Eis o que pode acontecer: a consequência mais directa, ainda que eu não me aperceba dela, é a melhora da minha auto-estima. Por pouca que seja essa melhora, a verdade é que irei enfrentar o dia que tenho pela frente com um pouco mais de boa disposição. Por mais leve que seja a diferença, alguém o irá notar, ainda que inconscientemente e, por exemplo preferir-me a mim em vez de outra pessoa para fazer a acta da reunião, que por acaso é uma coisa chata. Porém eu aceito. A minha presença na reunião faz com que, pela percepção de um elemento novo, a mesma corra melhor e os directores sairão dela mais animados. Então, na hora de decidir o aumento do ordenado do pessoal da empresa, a sua decisão é positiva. É claro que as coisas não se passarão exactamente desta forma, mas é um exemplo de como subtilmente as nossas acções provocam os acontecimentos, por vivermos num mundo interligado.

    Mas há ainda outra coisa que pode acontecer: desencadearmos acontecimentos que não estão nem directa nem indirectamente relacionados com as nossas acções. É o caso por exemplo de eu pintar os olhos hoje antes de ir para o trabalho e me sair a loteria. Desencadeei a sorte! Porque a sorte percorre canais de energia, que quando é negativa lhe são bloqueados. Agir faz com que a nossa mente fique mais aberta e mais receptiva, afastar a inércia alarga o espaço dentro de nós para podermos receber coisas boas, porque ela mesmo ocupa muito espaço como se de uma coisa ou um sentimento se tratasse.

    Não podemos pensar no ser humano isoladamente, nem no espaço ou no tempo como algo definido e imutável. Temos que pensar no universo como um todo e que tudo, mas mesmo tudo, interage com tudo. Acredito que um dia esta teoria ainda será aceite por todos como uma lei da física.

domingo, 31 de maio de 2009

O hábito de sentir

Hoje aconteceu-me uma coisa estranha. Reparei que tinha um vale que me tinha sido oferecido no natal para descontar em compras que estava a terminar o seu prazo de validade. Decidi gastá-lo no supermercado, considerando-o como um bónus, que iria aumentar o meu dinheiro disponível para efectuar as minhas compras.

Entrei no estabelecimento pensando que poderia comprar produtos de melhor qualidade e ainda algo extra. Comecei a percorrer as prateleiras e a colocar no cesto as coisas de que necessitava. Quando estava quase no fim, ao pegar numa lata de cerveja apercebi-me, espantada, que apesar de o meu dinheiro disponível ser superior ao normal, inconscientemente fui levada a escolher exactamente os mesmos produtos que comprava anteriormente: os mais baratos, embora de marcas diferentes. O meu cabaz era pobre e sobrava-me ainda muito dinheiro para gastar. Fiquei frustrada, porém em vez de ir trocar os produtos decidi guardá-lo para futuras ocasiões.

Podemos fazer uma analogia entre os produtos do supermercado e as nossas emoções. O que se passou comigo hoje passa-se com cada um de nós relativamente ao que sente. Na verdade, ainda que a nossa vida tenha mudado, que tenhamos todas as razões para sermos felizes, estamos habituados a "escolher" as mesmas emoções negativas que em tempos mais difíceis. Quantas vezes nos foi dado um aumento de ordenado que há muito ambicionávamos ou encontramos a pessoa amada e damos por nós a experimentar o mesmo medo, a mesma raiva, o mesmo ódio? Isto deve-se ao hábito. O nosso cérebro habituou-se a criar sempre as mesmas sinapses, abriu e alargou os caminhos para as essas emoções, enquanto os que levam á alegria estão cheios de ervas e pedras, muitas vezes é difícil perceber que ali existiu em tempos uma estrada. É difícil mudar, bem tentamos mas voltamos ao mesmo. Ficamos frustrados e no fim, sobra-nos ainda tempo que podíamos gastar na emoção "alegria", mas decidimos guardá-lo para quando os filhos crescerem, quando tirar a carta, quando fôr rica...

Muitas pessoas confundem emoções com sentimentos. No dicionário Petit Robert encontramos a seguinte definição de emoção: "Estado afectivo intenso, caracterizado por uma brusca perturbação física e mental onde são abolidas, na presença de certos estímulos ou representações muito vivas, as reacções apropriadas de adaptação ao acontecimento". O Petit Larousse acrescenta ainda: "Perturbação passageira provocada pela alegria, a surpresa, o medo, etc". Isabelle Filiozat define-a como "um movimento em direcção ao exterior, um impulso que nasce no interior de nós próprios e que fala ao que nos rodeia, uma sensação que nos diz quem somos e nos coloca em relação com o mundo". Esta psiquiatra e escritora francesa diz-nos ainda que todos os seres humanos, indempendentemente da sua raça, sexo ou idade as vivem da mesma maneira.

Cada emoção dura apenas alguns segundos. Se dura horas, não é emoção mas humor. Quando dura semanas já não é humor mas perturbação afectiva. Em contrapartida os sentimentos são duradouros.

Ao contrário dos sentimentos que podem ser inúmeros, existem apenas cinco emoções de base, embora alguns entendidos na matéria conseguem distinguir algumas mais. São elas a cólera, o medo, a tristeza, a alegria e o desgosto. Podem acrescer a estas a culpabilidade, o desespero, a raiva, a inveja, o ciúme, a surpresa, a excitação, a ternura, o amor. As emoções são biológicas, pulsionais, enquanto os sentimentos são elaborações secundárias porque são mentalizadas. Os sentimentos prolongam-se no tempo e geram ou são alimentados por emoções.

Ter consciência das nossas emoções, saber distingui-las dos sentimentos e conseguir identificá-las é uma forma de levar o nosso cérebro a deparar-se com mais hipóteses na altura de "escolher". É preciso persistência para mudar hábitos tão profundamente enraízados. Eu diria mesmo que é preciso coragem. A maior parte das pessoas acomoda-se, passa uma vida inteira infeliz à espera de um milagre que lhes limpe as estradas que levam a emoções positivas para então poderem desfrutar da alegria.

segunda-feira, 18 de maio de 2009

Teoria da Relatividade

Pequeno ou grande, mais ou menos, lento ou rápido, etc, só faz sentido quando haja um factor de referência em relação ao qual se possam fazer comparações. A Teoria da Relatividade de Einstein vigora não só na física mas em todas as dimensões da nossa vida (adaptada, claro está). Quer isto dizer que se compararmos, tudo fica mais fácil.

Relativizar é uma forma de combater a depressão. As pessoas deprimidas tendem a dar muito ênfase aos seus problemas, a dar demasiada importância a pormenores e a ter a ideia de que sofrem mais que os outros. Focalizam-se demasiado em si mesmas e abstraem-se do resto do universo. Desta forma, eliminam inconscientemente o factor de referência e abstêm-se de fazer comparações correctas. Toda a sua atenção está virada para si mesmas e mergulham em pensamentos pessimistas, atitudes negativas e sentimentos de culpa e de inferioridade. Mas há uma forma de mudar as coisas: comparar.


Quantas vezes não nos fartamos de chorar porque não somos amados, somos feios, não temos sucesso, etc.? Temos que perguntar, pois, qual o factor de referência que usamos para chegarmos a tal conclusão. Muitas pessoas não usaram nenhum, outras usaram modelos de topo para o fazerem. E que tal pensar em todas as pessoas que estão em pior situação que nós? Não temos um grande amor? Tivemos certamente uma mãe, um pai ou um irmão que nos amou muito. Há quem nem isso tenha tido; temos um nariz grande? Pelo menos situa-se dentro da normalidade. E aqueles que nasceram com uma qualquer deficiência física?; Estamos desempregados e sem dinheiro para ir ao supermercado? Pelo menos temos um tecto, água para beber e alguma roupa para vestir. Vemos todos os dias pessoas que não têm mais que a rua para dormir e vivem da esmola alheia. Quem somos nós para nos deprimirmos alegando razões tão fúteis?! Porque são razões fúteis se não as compararmos só com os melhores, os que têm mais ou os que são mais que nós.


Para sermos justos, temos que alargar a nossa comparação a todos aqueles que são piores, que têm menos ou que são menos que nós. Existem no mundo inteiro provavelmente mais pessoas em piores condições do que em melhores. Além disso, não passamos de seres minúsculos quando pensarmos na vasta dimensão do universo que nos rodeia, um grão de pó entre o pó das estrelas de que somos feitos. Somos apenas isso e nada mais. Pó de estrelas que um dia se transformou em vida e donde brotou consciência. Vale a pena pensar nisto!

sábado, 9 de maio de 2009

Feel the fear and do it anyway!

Susan Jeffers no seu livro "Feel the fear and do it anyway" (em português "Sentir o medo e avançar à mesma"), sustenta a tese de que o medo de qualquer coisa não é mais do que o medo de não a conseguirmos suportar. Se soubessemos que conseguiríamos suportar tudo o que nos possa acontecer na vida, não sentiríamos medo.

A palavra suportar leva a pensar em pessoas fortes, que conseguem vencer tudo e todos. Não é verdade. Neste contexto parece ter mais a ver com a inteligência em lidar com as situações do que com força. Se pensarmos bem, todos os nossos medos e receios têm subjacente a ideia de incapaciade. Por exemplo, quando alguém diz "Tenho medo de conduzir!", provavelmente não é de pegar num volante e manobrar um carro que estas pessoas receiam, nem sequer de sofrer um acidente por mais desagradável que isso seja: do que elas realmente têm medo é de não conseguir suportar as consequências de um possível acidente e os danos físicos e psicológicos que daí possam advir. O objecto do nosso medo é normalmente algo a cujas consequências damos demasiada importância, sentimo-nos impotentes para ultrapassar e a imaginação demasiado fértil leva a prever um futuro após demasiado aterrador e irreversível. Para algo de tais dimensões, não há manual ou conselho que nos valha. Sentimos que não controlamos os acontecimentos, porque não sabemos ou não podemos, e como tal não conseguimos lidar com eles.


O maior de todos os medos é o medo de ter medo. Mas não se baseia o medo já no próprio medo? Ou seja, se temos medo de ratos, não devemos antes pensar que aquilo que nos assusta realmente é o medo de não conseguir lidar com a sensação desagradável que nos causa a presença desses animais? Os objectos, os acontecimentos, as pessoas, não são causa de medo. A causa do medo é outro medo, o medo de não sabermos ou conseguirmos lidar com os nossos sentimentos e emoções. Mesmo a morte, que assusta quase toda a gente, é uma máscara para aquilo que realmente receamos. A possibilidade do fim da nossa existência física - e para muitas pessoas mais do que isso - leva a pensar no que foi a nossa vida, se a vivemos bem, se estamos a seguir o caminho certo, e provavelmente naquilo que haverá depois. Por um lado há que lidar com as nossas emoções e sentimentos (a frustração, a culpa, deixar assuntos inacabados, etc), e por outro enfrentar o desconhecido. A verdade é que não sabemos como lidar com estes dois assuntos. O nosso verdadeiro medo é o medo de não conseguirmos lidar com estes factos e não a própria morte. A partir do momento em que acreditamos que conseguimos enfrentar tudo o que nos apareça pela frente e de lidar com os nossos próprios sentimentos, a maioria dos nossos medos desaparecerá.


A ideia de valentia e coragem que temos de quem não tem medo por vezes pode estar totalmente errada. Por vezes quem não tem medo é porque não pensa, enterra a cabeça na areia ou não tem consciência das consequências dos factos. Há que estar consciente das consequências, do que nos espera no futuro. Porém, há que acreditar que aconteça o que acontecer, haveremos de saber lidar com a situação e ter fé em que a conseguimos superar.


Lágrimas secas

Ver fonte da imagem   So me apetece chorar, mas as lágrimas não caem.... É um alívio quando elas escorrem pelo rosto, pois é uma forma de ex...

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